segunda-feira, 28 de março de 2011

DOCES MOTES


A poesia
Flor sobre o piano
Nota sobre o vaso
Estranhos motes
Doces ocasiões
Feito pássaro em seu vôo matinal
Assim é a palavra em mim
Liberdade
solidão

segunda-feira, 21 de março de 2011

Um pouco de prosa pra falar de poesia


O escritor espanhol Enrique Vila-Matas "entrou" para a literatura de uma forma muito especial. Logo nos primeiros anos de colégio, apaixonou-se por uma daquelas adolescentes lindas e inalcançáveis que só quem já foi adolescente apaixonado sabe como é difícil (e necessário) alcançar.
Traçou um plano.


Copiou numa folha de caderno um poema do grande lírico espanhol Luis Cernuda, tendo, contudo, o cuidado de inserir, no meio do poema, um verso de sua própria autoria. Ofereceu-o à moça.No dia seguinte, quando recebeu os calorosos cumprimentos da, já não tão inacessível, jovem, pode compensar a sensação de fraude com a deliciosa sensação de que, em verdade, uma pequena parte daqueles elogios era de fato merecida, já que era autor de um dos versos do poema.Na semana seguinte: a mesma estratégia e outro poema de Luis Cernuda foi copiado no caderno, agora "infiltrado" por dois versos do próprio Vila-Matas. Novos cumprimentos, e uma sensação cada vez maior de merecimento. A coisa seguiu assim até que a moça, totalmente conquistada, já recebia poemas inteiros de Vila-Matas, sem a presença, agora incômoda, de Luis Cernuda.


A moça passou, mas Vila-Matas nunca mais abandonou a literatura. Embora, após a adolescência, tenha trocado a poesia pela prosa. Inclusive porque sempre há outras musas a conquistar, a quem dedicar poemas... Algumas de nomes muito conhecidos: "Glória", "Revolução", "Verdade"... É uma pena que nem a jovem e nem Vila-Matas tenham guardado os "originais" desses poemas. Assim teríamos uma idéia mais clara de como o autor de Bartleby e companhia foi afirmando sua própria voz no meio do cânone, representado ali pela grandeza de Luis Cernuda.


Afirmar sua própria voz em meio a uma tradição de tão poderosos solistas, os Baudelaire, os Drummond, os Shakespeare, as Ana Cristina Cesar, os César Vallejo, os Paulo Leminski, as Emily Dickinson etc, não é brincadeira...Não é brincadeira, mas Borges conseguiu, Thomas Bernard conseguiu, Czeslaw Milosz conseguiu, Paulo Henriques Britto conseguiu, Lu Menezes conseguiu... e não importam aqui hierarquizações do tipo "quem é mais importante que quem"... Deixemos essa ociosa tarefa para os que acham alguma graça em hierarquizar coisas que podem muito bem ser vistas de uma perspectiva não-hierárquica...Num de seus textos mais interessantes, T. S. Eliot dizia que toda vez que encontrava um sujeito que gostava de absolutamente "todos" os autores bons, e desprezava absolutamente "todos" os autores "não-bons", sentia que estava diante de alguém que era mais um "bom aluno" do que um verdadeiro amante da poesia... Alguém que aprendeu tudo direitinho...

Para ele, o sujeito realmente apaixonado por poesia deveria desgostar de pelo menos um poeta maior, daqueles que todo mundo gosta... e deveria, por algum motivo misterioso, trazer bem dentro do coração algum poeta menor, daqueles que ninguém gosta...



Carlito Azevedo é poeta, autor de Collapsus linguae, As banhistas, Sob a noite física e Sublunar, e ministra há dois anos oficinas literárias na Uerj.
pesquisa - sueliaduan
título no blog -sueliaduan

terça-feira, 1 de março de 2011

Perdida dos teus braços

Fato

e foco
ato consumado.
 me reviro
 me revolto
depois do ato
depois do fato
sem foco
cambaleante
na rua a esmo
perdida dos teus braços.